Os olhos do meu avô materno eram verdes e meio azulados também. Lembravam a cor da água do mar tropical. Eram olhos calmos e sempre atentos. Refletiam aquela alma e aquele jeito dele ser. Ele era leve e engraçado, muito embora, na maior parte das vezes eu não enxergasse isso claramente com meus olhos imaturos.
Os olhos do meu avô me olhavam e eu sabia que ele me amava muito. Que ele estava lá por mim, para o que quer que eu fizesse. Eles eram como dois faróis tentando me mostrar a direção certa. E ele se orgulhava de mim.
Os olhos do meu avô eram olhos de um caminhoneiro. Enxergavam longe e ele não precisava de óculos. E guiaram ele pelas estradas do Brasil por vários anos, subindo e descendo no mapa. Levando e trazendo coisas. Eram olhos que pareciam sempre agradecer.
Os olhos do meu avô gostavam do Palmeiras. Mas gostavam do Internacional também porque eu sou colorado. Eram olhos torcedores, mas que não sofriam por isso. Eram olhos de um catarinense radicado no Rio Grande do Sul.
Os olhos do meu avô eram olhos de pai. Um pai que amava loucamente os filhos e os netos. Que só queria o nosso bem. Eram olhos que ensinavam e tentavam mostrar que a vida não é fácil. Que trabalhar era bom. Que o esforço era sempre nobre. Que diziam para mim “vai trabalhar vagabundo!” num tom jocoso mas cheio de verdade. Olhos que procuravam serviço sempre, mesmo depois de aposentados.
Com suas histórias engraçadas, que ele contava repetidamente, e das quais nós ríamos de novo e de novo.
Os olhos do meu avô viram Santa Maria (RS) em algum momento no tempo na década de 50 e acharam que era uma terra de oportunidades. Era um bom lugar para sustentar uma família com dignidade.
Os olhos do meu avô eram naturais. E como tudo que é natural eles apenas existiam daquela forma. Olhando e aprendendo vida afora. Os olhos do meu avô nunca se apagaram da minha memória.
Os olhos do meu avô foram pouco à escola, numa época de muitas dificuldades e privações, mas que valorizavam quem estudava e que queriam os filhos e netos formados e educados.
Eram olhos esperançosos no futuro. De uma esperança calma, sem ansiedade. Olhos que já tinham visto tantas coisas e que sabiam que tudo nesta vida é passageiro. Olhavam sempre para frente e para o céu.
Os olhos do meu avô gostavam de ir na praia, assim como eu. Olhos que se fechavam e submergiam numa onda. E ele mergulhava destemidamente.
Os olhos do meu avô me chamavam de “Mano”, porque eu era o neto mais velho, coisa lá do sul.
Os olhos do meu avô queriam ter me visto formado médico, mas não viram. Não fisicamente. Naquele mesmo mês da minha colação de grau aqueles olhos se apagaram para esta vida e foram ter em outro plano. Eles se foram e eu nunca pude agradecê-los.
Ainda lembro bem daqueles olhos e daquele rosto amigo. Do meu amigo e pai e avô para sempre.
Caê Martins – CRM/PR – 20965.
Carlos Eduardo dos Santos Martins – Médico Anestesiologista.